Núcleo Experimental comemora 20 anos de trajetória com nova temporada do musical Codinome Daniel

Com texto e direção de Zé Henrique de Paula e música de Fernanda Maia, espetáculo prestigia a vida de Herbert Daniel, importante ativista gay que desafiou o regime militar opressor e também os setores da esquerda que reproduziam a homofobia

PALCO COMMÚSICA

11/24/20255 min ler

a man and woman sitting on a bench in a room
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O Núcleo Experimental reestreia o musical Codinome Daniel, com texto e direção de Zé Henrique de Paula e música de Fernanda Maia. A peça presta uma poética homenagem à vida e a obra do ativista, jornalista e escritor Herbert Daniel (1946-1992). O espetáculo fica em cartaz na sede do grupo na Barra Funda, de 3 a 17 de dezembro, com apresentações de segunda a quarta, às 20h. Com o espetáculo, o Núcleo Experimental dá início às celebrações de seus 20 anos e segue com diversas ações em 2026.

Em suas duas décadas de trajetória, o Núcleo Experimental vem desenvolvendo, em meio à multiplicidade de temáticas, atividades e ações, uma pesquisa contínua a respeito da utilização da música e sua relação com o teatro, sobretudo em relação ao modo brasileiro de se fazer Teatro Musical. Como resultado desse trabalho de investigação, entendemos a necessidade cada vez maior de nos aprofundarmos na concepção e criação de dramaturgia e musicais originais brasileiros, promovidos por um anseio em dar voz a grupos minoritários ou a temas urgentes no contexto sociopolítico atual.

Através do musical original Codinome Daniel, o grupo pretende levar ao público a vida e a obra, ainda muito desconhecida, do jornalista e escritor Herbert Daniel, um revolucionário gay que desafiou tanto a ditadura de direita quanto os setores da esquerda que reproduziam a homofobia e a heteronormatividade. Um dos elementos de frente da luta armada, exilou-se em Portugal e na França, onde contraiu HIV, foi o último dos anistiados e uma vez de volta ao Brasil, tornou-se um ativista fundamental na luta pelos direitos das pessoas vivendo com HIV/Aids. Sua importância também se deve ao fato de ter sido o fundador do grupo de apoio Pela Vidda e um dos fundadores do Partido Verde. Atuou pelos direitos da população LGBTQIAPN+, das mulheres, dos negros, além de ativista ambiental. Herbert morreu em 1992 devido a complicações causadas pela AIDS.

Mas, afinal, quem foi Herbert Daniel?

A figura de Herbert Eustáquio de Carvalho - o nome de batismo de Herbert Daniel - é uma das mais esquecidas da nossa história recente, especialmente quando se leva em conta sua importância na luta pelo movimento gay e pelo ativismo em prol da democracia durante a ditadura no Brasil. Herbert foi um elemento importante na luta armada contra a ditadura de 1964 e no processo de redemocratização do Brasil. Estudante de medicina na UFMG, se engajou em grupos guerrilheiros ainda no final da década de 1960. Esteve na linha de frente de assaltos a bancos e dos sequestros de diplomatas estrangeiros que garantiram a soltura de mais de uma centena de presos políticos que corriam risco de morte.

Na militância clandestina, Herbert descobriu e assumiu sua homossexualidade. De um lado, ele se encontrava acossado pela violência de uma ditadura moralizante e LGBTfóbica; de outro, não era aceito por parte dos seus companheiros de guerrilha. Para muitos setores das esquerdas naquele momento, a homossexualidade era vista como um desvio pequeno-burguês, uma degeneração, uma fraqueza moral, um desbunde de minorias improdutivas, em suma, um “pequeno drama da humanidade” que dividiria a “luta maior”. Herbert teve então que “esquecer sua homossexualidade” para “fazer a revolução”. Tanto se dedicou que seu rosto chegou a estampar os cartazes dos “subversivos” mais procurados pelo regime autoritário. No entanto, mesmo com o cerco crescente e o extermínio físico da luta armada, ele conseguiu escapar da prisão e das torturas, exilando-se em 1974 em Portugal e, depois, na França. No exterior, contraiu HIV e se tornou, ao retornar ao Brasil como o último dos anistiados, um ativista fundamental pelos direitos das pessoas vivendo com HIV e AIDS.

Morto em 1992, Herbert foi um revolucionário gay que desafiou tanto a ditadura de direita quanto setores de esquerda que reproduziam a heteronormatividade. Passou pelo Partido dos Trabalhadores e fundou o Partido Verde e o grupo Pela VIDDA, sempre atuando pelos direitos dos homossexuais, pela ecologia e pelas lutas das mulheres e negros. Foi o responsável também pela criação da Declaração dos Direitos Fundamentais da Pessoa Portadora do Vírus da AIDS, que estruturou o discurso em relação à epidemia, além de cunhar o conceito de “morte civil” - referindo-se à condição de pária em que a pessoa com HIV é colocada, uma espécie de morte social antes da morte física - mostrando que não se trata apenas de uma questão de saúde, mas também sexual, social, econômica e de direitos humanos.

Ele trouxe ideias revolucionárias para enfrentar a doença e o preconceito social, e elas ainda são válidas até hoje, como a ideia de solidariedade no combate à epidemia”, afirma o historiador e brasilianista norteamericano James Green, que lançou uma biografia de Daniel em 2018 (Revolucionário e Gay: a extraordinária vida de Herbert Daniel). “Ele era muito corajoso, foi uma das primeiras primeiras pessoas conhecidas a assumir ser gay e soropositivo.” A biografia escrita por Green é a grande fonte de inspiração para a dramaturgia de Codinome Daniel, escrita por Zé Henrique de Paula. A música da peça é composta por Fernanda Maia.

O teatro - uma das primeiras paixões de Herbert Daniel em sua juventude (ele foi também dramaturgo) - pode ser uma ferramenta poderosa no sentido de reacender uma luz sobre essa figura menosprezada da história do movimento LGBTQIAPN+ no Brasil recente. Afinal, sendo a memória uma construção social, a peça ajuda a colaborar para que minorias possam entrar em contato com o inventário da luta pela democracia, diversidade e justiça social.

Codinome Daniel forma, junto com outros dois espetáculos musicais e autorais do Núcleo Experimental - Lembro todo dia de você e Brenda Lee e o Palácio das Princesas - o que chamamos de Uma trilogia para a vida. A trilogia traz como fio condutor das três peças um conjunto de discussões e pontos de vista a respeito da questão do HIV/Aids no Brasil, da década de 80 aos dias de hoje.

No elenco de Codinome Daniel temos: Davi Tápias, Luciana Ramanzini, Fabiano Augusto, Robson Lima, Bruna Guerin, Cleomácio Inácio, Renato Caetano e Fábio Enriquez.

Ficha Técnica

Dramaturgia e Letras: Zé Henrique de Paula

Música original: Fernanda Maia

Direção: Zé Henrique de Paula

Direção musical: Fernanda Maia

Assistência de direção musical: Guilherme Gila

Assistência de direção: Mafê Alcântara

Cenografia: César Costa

Figurinos: Úga Agú e Zé Henrique de Paula

Assistência de Figurino: Cauã Stevaux e Ana Trucharte

Iluminação: Fran Barros

Desenho de som: João Baracho

Preparação de elenco: Inês Aranha

Visagismo: Dhiego D'urso

Cenotécnica: Jhonatta Moura

Produção: Laura Sciulli e Victor Edwards

Fotos: Ale Catan

Design gráfico: Laerte Késsimos

Textos para programa: Isa Leite

Assessoria de imprensa: Pombo Correio

Redes sociais: 1812 Comunicação

Sinopse

Conhecido por dar voz a grupos minoritários e por sua pesquisa sobre o modo brasileiro de se fazer Teatro Musical, o Núcleo Experimental homenageia em seu novo trabalho o jornalista Herbert Daniel (1946-1992), ativista LGBTQIAPN+ na luta pelo direito das pessoas com HIV/Aids.


Serviço

Codinome Daniel, com Núcleo Experimental

Temporada: 3 a 17 de dezembro de 2025

Às segundas, terças e quartas-feiras, às 20h

Haverá bate-papo após todas as apresentações


Ingressos: R$40 (inteira) e R$20 (meia-entrada)

Venda pela Sympla

Teatro do Núcleo Experimental - Rua Barra Funda, 637

Classificação: 12 anos

Duração: 120 minutos

Mais informações em @nucleoexp


Este projeto foi contemplado na 45ª edição do Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a cidade de São Paulo.